A ANAMPA em seus primeiros 200 dias de ação.

Desde sua fundação, a ANAMPA demonstrou que veio, não apenas para ser uma entidade representativa, e sim, para ser protagonista na defesa de magistrados, procuradores e pensionistas aposentados. Nestes primeiros 200 dias, nossa diretoria percorreu diversos gabinetes parlamentares, dialogou com ministros, participou de eventos estratégicos e entregou propostas concretas com o objetivo de garantir paridade, respeito e visibilidade aos aposentados.Essa mobilização não é casual. É fruto de um projeto coletivo que entende que a aposentadoria nãoencerra o compromisso com a justiça – ela o fortalece. Ao ocupar os espaços institucionais comlegitimidade, técnica e sensibilidade, a ANAMPA pavimenta um novo capítulo na história da representação dos aposentados do Judiciário e do Ministério Público da União.

“Temos voz, saber e história — e vamos usá-los”, defende diretora Zelia Montal

Como bem ilustra a concepção de Miguel de Cervantes em Dom Quixote – posteriormente sintetizada e popularizada por Raul Seixas – “O sonho que se sonha só é apenas um sonho, o sonho que se sonha junto é realidade”. Essa citação não é apenas simbólica para Zélia Montal, Diretora Jurídica da ANAMPA. Ela resume seu espírito de coletividade e sua crença no potencial transformador da união entre aposentados e pensionistas da magistratura e do Ministério Público da União. Com ampla trajetória no Ministério Público do Trabalho, onde atuou por mais de duas décadas, Zélia segue engajada após a aposentadoria — e vê na ANAMPA um espaço para continuar fazendo justiça e contribuindo com a sociedade. Sua luta atual, porém, se dá em outras frentes: no resgate da paridade, na valorização da experiência e na defesa da dignidade funcional dos aposentados. Coautora de um dos artigos mais lidos do portal JOTA — “Justiça fiscal também passa pelos aposentados do serviço público” —, ela tem alertado para os efeitos da licença compensatória (LC). Ao longo desta entrevista, Zélia compartilha sua trajetória e analisa com profundidade os caminhos possíveis para enfrentar essas desigualdades. Ela acredita que, diante da resistência administrativa e judicial, é no Legislativo que mora a maior esperança de mudança — e destaca que o conhecimento e a articulação política são armas poderosas nesta luta. Nesta conversa, ela também propõe que a ANAMPA vá além da pauta remuneratória. Para ela, a associação pode e deve se tornar um espaço de produção e difusão de conhecimento, envolvendo os associados em projetos que dialoguem com a sociedade e promovam a cidadania. “A aposentadoria não precisa ser o fim, mas um recomeço. A experiência que acumulamos pode e deve ser compartilhada. Temos na ANAMPA mentes brilhantes, pessoas com uma bagagem imensa que ainda podem contribuir muito para a sociedade”. É imperativo destacar a relevância do pensar coletivo e da convergência de esforços para a materialização de ideias em ações efetivas. Através do compartilhamento de ideais e de ideias e da cooperação mútua, será possível atingir os objetivos institucionais e as metas da ANAMPA. Como surgiu a escolha pela carreira jurídica? O que a motivou a ingressar no Ministério Público? Zélia Montal – Minha primeira inclinação foi pela Administração. Iniciei o curso, mas logo percebi que não era o meu caminho. Depois disso, ingressei na faculdade de Economia, mas, no terceiro ano, a mesma sensação, e não me via passando o resto da vida fazendo algo que não me realizava. Foi então que decidi tentar o Direito, influenciada também pela minha irmã, que é procuradora do Estado da Bahia. Logo percebi que ali era o meu lugar. Me encontrei no curso e, após me casar, concluí a graduação já em São Paulo. Durante dez anos, atuei em escritório de advocacia com Direito Civil, Administrativo, Previdenciário, de Família entre outras áreas. Foi quando comecei a lidar mais diretamente com Direito Previdenciário e Acidentário — áreas que, de certa forma, dialogam com o Direito do Trabalho. Esse contato me despertou o interesse em prestar concurso para o Ministério Público. Na mesma época, cheguei a me inscrever para a magistratura, mas, quando fui nomeada no MP, não dei continuidade a essa outra possibilidade. Sempre tive uma preocupação muito forte com questões sociais. Temas como gênero, inclusão de pessoas com deficiência, refugiados e demais minorias sempre me tocaram profundamente. E o Ministério Público me pareceu o espaço onde eu poderia, de fato, contribuir. Iniciei na 15ª Região, em Campinas, e, já no mês seguinte, fui transferida para São Paulo. Isso foi em 1988, bem na efervescência do processo constituinte. O concurso foi longo e exigente — a gente precisava dominar tanto o ordenamento antigo quanto as novidades que a nova Constituição traria. Mas deu tudo certo. Sigo dizendo que, mesmo aposentada, o Ministério Público não saiu de mim. Quais foram os seus maiores desafios e que marcaram essa sua trajetória de três décadas de atuação no Ministério Público do Trabalho? Zélia – Olha, um dos maiores desafios — especialmente no Direito do Trabalho — sempre foi garantir a efetividade dos direitos previstos na Constituição. Como estudiosa e entusiasta do Direito Constitucional e posso afirmar: nossa Constituição é riquíssima, principalmente no que diz respeito aos direitos sociais. O artigo 6º trata desses direitos, e o artigo 7º tem XXXIV incisos assegurando direitos trabalhistas. Mas o problema é fazer com que esses direitos sejam respeitados na prática. Como aponta com muita propriedade Norberto Bobbio, o problema dos direitos humanos não está em fundamentá-los, mas em protegê-los, garanti-los, impedir que, apesar de proclamados nas Constituições e mesmo em diversos instrumentos de âmbito internacional, eles continuem a ser sistematicamente desrespeitados e violados. A circunstância de estarem previstos na Constituição não é garantia de que os direitos fundamentais sejam efetivamente cumpridos. A formalização dos direitos evoluiu muito, mas a preocupação atual não é propriamente formal (inserir mais direitos no corpo da Constituição), mais que isso, o que importa é fazer com que esses direitos positivados sejam efetivados. De outra parte, a interpretação muitas vezes varia de acordo com ideologias, com interesses, e isso compromete muito a proteção dos direitos sociais, de modo particular a dos direitos trabalhistas. É preciso, pois, estar vigilante! Nesse sentido, a importância fundamental do Ministério Público do Trabalho. Sempre me vem à lembrança que, quando ingressei, a estrutura do Ministério Público do Trabalho era muito precária. Em São Paulo, havia um estoque de 40 mil processos acumulados por falta de procuradores. Não tínhamos gabinete próprio — eu e mais três colegas dividíamos uma sala. Faltavam recursos materiais e humanos. Trabalhamos demais para vencer aquele passivo. Por isso, quando ouço falar hoje em Licença Compensatória (LC), fico perplexa. Nós enfrentamos tudo aquilo sem qualquer tipo de compensação, com muita dedicação, sabíamos que fazia parte da nossa “missão”. Então, olhando para trás, vejo que os desafios foram muitos, mas a vontade de cumprir a nossa missão sempre falou mais alto. Ao se aposentar, como a senhora percebeu essa transição da ativa para a

Henrique Ellery traz experiência acumulada nos Três Poderes para impulsionar a missão da ANAMPA

Antonio Henrique de Carvalho Ellery, ou simplesmente Henrique Ellery, é um nome que está nas origens. Foi um dos idealizadores e fundadores da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), ajudou a articular a criação de duas regiões da Justiça do Trabalho e participou ativamente da indicação da primeira mulher a compor o Tribunal Superior do Trabalho. Com uma carreira de mais de 53 anos dedicados ao Ministério Público da União – junto a Justiça do Trabalho, Ellery é daqueles personagens que misturam memória institucional com engajamento. E, como ele próprio gosta de repetir, “vencer sem luta é triunfar sem glória.” Atual Diretor Legislativo da ANAMPA, ao lado de Denise Lapolla, ele integra a primeira gestão da entidade com a convicção de um pioneiro e a experiência de quem conhece os bastidores do Parlamento como poucos. É, nas palavras do ex-procurador da República, Dr. Geraldo Brindeiro, “o inativo mais ativo” de que se tem notícia — e talvez o mais fiel à ideia de que a história é o único caminho legítimo para construir o futuro, porém, consciente de que o Ministério Público não reverencia o seu passado. Nascido em Natal, no Rio Grande do Norte, Henrique Ellery não chegou a ser registrado na cidade. Apenas 12 dias após seu nascimento, seu pai — oficial do Exército — embarcou com toda a família rumo ao Rio de Janeiro para iniciar o curso de formação em engenharia no Instituto Militar de Engenharia. Foi lá que viveu até os cinco anos de idade. A partir daí, sua infância e juventude foram marcadas por constantes mudanças de estado em estado, acompanhando o pai em sua missão de servir ao país como engenheiro militar. Sem jamais ter criado raízes em sua terra natal, Henrique Ellery seguiu os passos de Ariano Suassuna e encontrou em Pernambuco — mais especificamente em Recife — a terra do seu coração. Foi lá que se formou pela tradicional Faculdade de Direito do Recife e iniciou uma trajetória que o levaria aos bastidores dos Três Poderes, com passagens pela Presidência da República e pelo Governo do Distrito Federal. E hoje usa esse conhecimento a favor de uma causa que considera urgente e inadiável: a defesa dos aposentados e pensionistas do Ministério Público e da Magistratura da União. Sua motivação? A justiça, sempre pautada no espírito da lei. Mas também a memória. “A ANAMPA me deu essa missão — e eu a cumpro não só pelos colegas, mas pelas mulheres dos colegas, pelas pensionistas, por tudo que esses homens e mulheres fizeram pelo Brasil”, afirma. Com fé, indignação e um grande senso de responsabilidade, ele tem sido uma peça-chave nas articulações legislativas em Brasília. E vê, no fortalecimento da entidade, a única forma de reparar uma injustiça histórica e evitar o silêncio que costuma vir depois da aposentadoria, tendo como maior bandeira o respeito aos colegas de ontem. Nesta entrevista, Henrique Ellery, hoje aos 78 anos, compartilha marcos da sua trajetória, bastidores de sua atuação nos Três Poderes e reflexões sobre o valor da união, da verdade e do respeito à história. Para ele, a ANAMPA é mais que uma entidade: é um gesto coletivo de dignidade. Como é que o senhor chegou ao Ministério Público? Já era uma carreira pensada muito antes da faculdade? Henrique Ellery – Na verdade, meu sonho era ser militar. Eu vim do Colégio Militar, mas fui impedido por não alcançar a os requisitos de saúde exigidos — na época, já tinha 7, 5 de miopia — e nas Forças Armadas, ou pode ou não pode, não tem jeitinho. Terminei o colégio militar de Belo Horizonte (MG) e fui para o Recife, onde ingressei na Faculdade de Direito do Recife e me encantei com a profissão. Comecei como estagiário num escritório de advocacia no primeiro semestre. Fiquei muito próximo do Tribunal de Justiça de Pernambuco — eu vivia mais dentro do tribunal do que em casa. Naquela época, eu brincava dizendo que era “gandula de processo” — e com muito orgulho. E, aos 78 anos, sigo com o mesmo espírito: sempre pronto para correr atrás do que for preciso pela efetividade do Direito. Entretanto, foi com o prefeito do Recife, Dr. Augusto da Silva Lucena, do qual foi oficial de gabinete entre 1966 e 1970, que forjei meus conhecimentos na arte da política, da diplomacia e da negociação com o Legislativo. Tive como mentores, além do prefeito, o então senador Barros de Carvalho. Em 1970, fui trabalhar com o presidente da República, como assessor especial, ao mesmo tempo em que atuava com o secretário de obras e também com o governador de Brasília. Era tudo simultâneo. Mas foi num almoço no Rio de Janeiro, com membros históricos do Ministério Público da União junto à Justiça do Trabalho — como Evaristo de Moraes, Danilo Pio Borges, João Antero de Carvalho, José Maria Caldeira, Roque Vicente Ferrer, Adelmo Monteiro de Barros, Brígido Tinoco e Benjamim Eurico Cruz — que minha ligação com o Ministério Público se fortaleceu. Passei a frequentar aquele grupo semanalmente, e foi ali, entre figuras notáveis do Ministério Público do Trabalho, que recebi dois dos maiores incentivos da minha vida: lutar pela criação da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e me tornar procurador. E foi com esse apoio que abracei a missão. Em fevereiro de 1974, fui nomeado pelo presidente Médici ao cargo de Substituto de Procurador do Trabalho Adjunto, do Ministério Público da União, junto à Justiça do Trabalho, com sede na 6ª Região, em Recife. O senhor tem uma história que se confunde com a do próprio Ministério Público do Trabalho. Conte-nos um pouco mais sobre essa sua luta para fundar a ANPT. Ellery – Foi uma missão muito difícil. O ministro Armando Falcão, que assumiu após o professor Buzaid, não era muito simpático à ideia. A cada tentativa, o Palácio devolvia os nomes da diretoria com vetos — voltaram cinco ou seis vezes. Curiosamente, eu nunca colocava meu nome. Sempre escolhia colegas de primeira categoria. No fim, o Planalto aprovou os nomes, mas exigiu

“Nossa missão é dar visibilidade e fortalecer os direitos dos aposentados, com serenidade e firmeza”, diz Nelson Cardoso

Como Diretor Jurídico Adjunto da ANAMPA, Nelson Cardoso dos Santos tem trabalhado para ampliar o reconhecimento e a valorização dos aposentados e pensionistas da magistratura e do Ministério Público da União. Integrante da primeira gestão da associação, ele vê na entidade um espaço necessário para tratar das questões que impactam quem dedicou anos ao serviço público e hoje enfrenta perdas acumuladas na remuneração. “Nossa missão é dar visibilidade e respeito à história de quem contribuiu durante anos”, resume. Sua aproximação com o movimento associativo começou após a aposentadoria, quando percebeu que muitos colegas sequer tinham clareza sobre o impacto das novas verbas criadas exclusivamente para quem está na ativa. A chamada Licença Compensatória (LC), a Gratificação por Exercício Cumulativo de Jurisdição (GECJ) e a Gratificação por Exercício de Cargos ou Funções Administrativas e de Assessoramento (GECO) acentuaram a disparidade remuneratória entre ativos e aposentados e pensionistas, criando uma situação que, para Nelson, precisa ser amplamente debatida. Na ANAMPA, ao lado da Diretora Jurídica Zélia Montal e demais integrantes da Diretoria, além da busca da paridade para aqueles que a detêm e sem descurar de questões mais específicas que interessam aos “migrados”, Nelson atua em frentes como a defesa do pagamento do retroativo do Adicional por Tempo de Serviço (ATS), a revisão do auxílio-saúde e o fortalecimento da base de associados, considerada por ele estratégica para dar peso institucional às demandas da entidade. Sua experiência de 24 anos na magistratura contribui para a compreensão dos desafios e das oportunidades de diálogo com as diferentes instâncias. Nesta entrevista, ele aborda um pouco da sua trajetória, explica por que decidiu integrar a primeira gestão da ANAMPA e avalia as perspectivas para as pautas da associação. Com serenidade, ele destaca a importância de manter o trabalho coletivo e acredita que o engajamento crescente da categoria é um sinal positivo. Como o decidiu seguir a carreira jurídica? Foi algo planejado, um desejo antigo, ou acabou se aproximando da magistratura por outros caminhos? Nelson Cardoso dos Santos: Venho de uma família do interior de Pernambuco, e depois de concluir o ensino médio migrei para São Paulo, por opção familiar. Trabalhei por muito tempo no antigo Banco do Estado de São Paulo, o antigo Banespa. E, sinceramente, o Direito não estava nos planos. Certo dia, em uma das comunicações internas que rotineiramente eram encaminhadas às Agências, em especial aos “Chefes de Serviço”, soube da relevância do cargo de Advogado na estrutura do Banco, tanto no aspecto remuneratório, quanto para a progressão na carreira. Ingressei na Faculdade de Direito e, após a graduação, no primeiro concurso interno para Advogado, fui aprovado e nesta condição passei a atuar no Departamento Jurídico do banco. Só que, nesse intervalo entre terminar a faculdade e fazer o concurso, houve alterações substanciais no estatuto do banco e o cargo de advogado deixou de ser atrativo. Fiquei bastante decepcionado com aquilo e, pouco depois de ir para o jurídico, eles lançaram um plano de demissão voluntária, ao qual eu aderi. Dali em diante comecei a prestar todos os concursos que apareciam e que me interessavam: Magistratura e Ministério Público, Federal e Estadual, tendo como foco principal Justiça do Trabalho, onde os concursos na época eram mais frequentes. Casado, com duas filhas pequenas, “arrimo de família”, achei que seria uma transição rápida, porque tinha ido bem na primeira prova, para a magistratura federal. Eu tinha a indenização do PDV, que segurava as contas por uns 12 meses, mas sabia que o tempo estava correndo. Foi um período de muita dedicação, estudando bastante, porque tinha que dar certo. Felizmente, consegui ser aprovado na magistratura do trabalho em nove meses, um prazo até curto diante da média que via nos colegas. E ao longo desses anos de magistratura, depois desse ingresso tão marcante, quais foram os maiores desafios e mudanças que presenciou na carreira? Nelson: O momento mais marcante, sem dúvida, foi o da minha entrada na magistratura. Eu estava desempregado, com uma responsabilidade financeira grande, e prestando vários concursos ao mesmo tempo. Na época, eu já tinha chegado à fase final em vários TRTs e no Ministério Público do Estado de São Paulo. Lembro-me que fui ao tribunal para saber o tema sorteado para a minha argüição oral, conversei com a coordenadora do concurso, a dona Cleide — uma senhora já de idade — e ela, com muita simpatia, me disse: “Olha, doutor Nelson, vá até a biblioteca, e peça um livro emprestado, diga que fui eu que mandei.” Fui até lá, mas o servidor da biblioteca respondeu que não podia emprestar o livro, porque era exclusivo para magistrados. Então, eu disse a ele: “Não tem problema. Você me emprestando ou não, eu vou passar da mesma forma e, quando eu voltar aqui como juiz, você vai ter que me emprestar.” Esse episódio ficou marcado para mim, pela autoconfiança manifestada. No dia da prova oral, enquanto ajeitava a gravata, o nó ficou impecável de primeira. Ali eu senti que seria o meu dia. E realmente foi. Inclusive, foi um concurso atípico na 2ª Região, porque dos mais de 2.600 candidatos, só dois foram aprovados. A prova objetiva, em especial, foi extremamente difícil, daquelas em que é complicado até entender a expectativa do examinador, apenas trinta e dois candidatos foram para a segunda fase. Por coincidência — ou não, porque dizem que acaso não existe —, os dois aprovados éramos da mesma faculdade, a Católica de Direito de Santos, da mesma turma: eu e um colega que ainda está na ativa, Dr. Bruno Wagner. O senhor atual na magistratura do trabalho por 24 anos. Nesse período, se envolveu diretamente com as associações de classe? Nelson: Não, eu, particularmente, sempre preferi focar no meu trabalho. Tenho um perfil de não acumular muitas atividades ao mesmo tempo — embora agora, ironicamente, esteja fazendo várias coisas de forma simultânea. Durante o período em que estive na ativa, optei por não integrar diretorias nem aceitar convites para dar aulas, justamente para manter o foco exclusivo na magistratura. Minha prioridade era

ANAMPA reúne magistrados e membros do MP aposentados para debater paridade e direitos

A Diretoria da ANAMPA reuniu-se nesta segunda-feira (07) com integrantes das magistraturas e membros dos Ministérios Públicos estaduais aposentados para discutir temas de interesse do segmento. Atendendo a convite formulado pela Presidente Sônia Roberts e pela Vice-Presidente Regina Butrus, a Presidente da Comissão Nacional de Aposentados e Pensionistas da CONAMP, Ana Maria Mai, e a Vice-Presidente de Aposentados e Pensionistas da AMAGES, Janete Pantaleão Alves, bem como magistrados e membros do MP oriundos de diversas unidades da federação, conversaram sobre questões que têm inquietado e preocupado os aposentados, notadamente a quebra da paridade que está a ocorrer tanto no âmbito federal quanto em nível dos estados. A troca de ideias e experiências foi bastante proveitosa, revelando que aposentados e pensionistas devem unir forças para assegurar os seus direitos, lutando por parcelas que contemplem igualmente ativos e aposentados, a fim de assegurar condições equânimes de remuneração e benefícios, de forma a manter íntegro o constitucional direito à paridade a que a maioria ainda faz jus. Pela ANAMPA, estiveram presentes ainda a Secretária-Geral, Neide Folador, a Diretora Jurídica, Zélia Montal, o Diretor Jurídico Adjunto, Nelson Cardoso dos Santos, a Diretora Legislativa, Denise Lapolla, o Diretor Legislativo Adjunto, Henrique Ellery, a Diretora de Comunicação, Virgínia Bahia, e a Coordenadora da Região Centro-Oeste, Sandra Cureau. Também estiveram presentes os seguintes magistrados e membros aposentados dos Ministérios Públicos Estaduais: Adélia Pessoa (MP/SE), Ézio Luiz Pereira (TJ/ES), Claúdio Barros Silva (MP/RS), Antônio Carlos Paiva Homung (MP/RS), Adriana Ribeiro da Costa Cecon (MP/MG), Alonso Gomes (MP/SE), Alemer Moulin (TJ/ES), Clóvis Ramos Sodré (MP/PE), Diana Cavalcante (MP/CE), José Messias Oliveira (MP/TO), José Carlos Risk (TRT/ES), Judith Cristina Lopes (MP/ES), Maria Elisabete Jerônimo (MP/MS), Maria José V. da Costa Resende (MP/PE), Francisco Raulino Neto (MP/PI), Rovena Ferraz de Souza (MP/ES), Vivaldino Ferreira (MP/MT), Wanda Luczynski (MP/PA) e Wanderlei Carvalho da Silva (MP/PR).

Neide Consolata explica por que a ANAMPA não vai recuar: “Substitutos recebem como ministros, enquanto aposentados perdem até 1/3 da remuneração”

Ela trocou as Letras pelas leis e nunca mais parou. A atual secretária-geral da Associação Nacional de Magistrados Aposentados do Poder Judiciário da União e de Procuradores Aposentados do Ministério Público da União (ANAMPA), Neide Consolata Folador, começou a vida acadêmica estudando inglês para ser tradutora, mas foi no serviço público que encontrou sua verdadeira vocação. Gaúcha, ingressou como servidora da Justiça do Trabalho do TRT da 4ª. Região (Rio Grande do Sul) ainda jovem e logo percebeu que queria ir além. Mudou de cidade, cursou Direito, tornou-se juíza, passou por diversas comarcas enquanto substituta e, promovida a titular da 2ª. Vara do Trabalho de Foz do Iguaçu, lá permaneceu até sua aposentadoria. Aposentada desde os 51 anos, com direito à paridade e integralidade, Neide assistiu à corrosão dos direitos dos aposentados prometidos pela Constituição. O que começou com a exclusão dos aposentados do auxílio-moradia tornou-se mais grave com a criação de benefícios remuneratórios travestidos de verbas indenizatórias, como a Licença Compensatória (LC), paga apenas a quem está na ativa. “Por incrível que pareça, ainda encontramos colegas aposentados e pensionistas que não sabem o que é a LC. Muitos não imaginam que um juiz substituto está ganhando praticamente o dobro do que eles recebem. É uma inversão completa de valores — temos substitutos recebendo mais que ministros do STF”, disse. A indignação com esse cenário a motivou a sistematizar o problema no artigo A defasagem remuneratória dos aposentados das carreiras jurídicas, em que descreve os seis atos que, na sua visão, violam frontalmente o regime do subsídio único e, por consequência, a paridade. Foi também esse incômodo que a levou a assumir uma nova missão. Ela esteve no centro do movimento pela criação da ANAMPA desde os primeiros grupos de WhatsApp, passando pela articulação interestadual entre magistrados e procuradores, até a fundação formal da entidade, em 28/10/2024. Hoje, como secretária-geral da associação, ajuda a expandir a base de associados e trabalha pela valorização dos aposentados e pensionistas. Nesta entrevista, Neide revisita sua trajetória e revela por que, mesmo diante de tantas dificuldades, o movimento não vai recuar. “Estamos enfrentando gigantes, é verdade. Mas já conquistamos muitos espaços e isto significa que estamos no caminho certo”, afirma. Houve algum incentivo para sua escolha pela magistratura ou foi algo que surgiu ao longo da sua trajetória profissional? Neide Consolata Folador: Na minha família não havia ninguém ligado ao Judiciário. Somos cinco irmãos, quatro formados em Direito, mas só eu segui carreira jurídica. Direito, aliás, foi minha segunda faculdade. Antes, cursei Letras, porque sempre gostei muito de línguas. Fiz bacharelado em Letras, com o objetivo de ser tradutora. No ano em que me formei, no entanto, fui chamada no concurso público que eu havia feito para servidora da Justiça do Trabalho, no Rio Grande do Sul. E ali encontrei minha realização profissional. Trabalhar com processos, com a rotina do Judiciário, era tudo o que eu queria. Mas digo que a faculdade de Letras não foi em vão. Ela me ajudou muito a desenvolver uma boa redação, o que foi fundamental no concurso para a magistratura — especialmente nas provas dissertativa e de sentença. Enquanto servidora, formada em Letras, percebi que, para crescer dentro da Justiça do Trabalho, eu precisaria também cursar Direito. Transferi minha residência de Porto Alegre para minha cidade natal, no interior do Rio Grande do Sul e fiz a faculdade de Direito em Passo Fundo, viajando 160 Km por dia, entre ida e volta, durante cinco anos. Durante o curso, continuei atuando como servidora do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região e, nos últimos dois anos, fui diretora de secretaria – cargo mais elevado para servidor, subordinado apenas ao juiz. Depois de formada, comecei a prestar concursos para juíza do trabalho nos três estados do Sul. Fiz três concursos ao longo de três anos, até ser aprovada no Paraná. No início, ainda morava no Rio Grande do Sul e me deslocava semanalmente para o Paraná – primeiro de ônibus, depois de carro. Mantive essa rotina por dois anos e meio até decidir me mudar definitivamente para o Estado que me aprovou, já que não foi possível fazer permuta para o RS. Fui morar em Curitiba, onde atuei por cinco anos como juíza substituta, até ser promovida a juíza titular e designada para a 2ª. Vara do Trabalho de Foz do Iguaçu, onde permaneci por dez anos, até a aposentadoria. A senhora tinha alguma expectativa específica ao ingressar na magistratura? O que encontrou ao longo da carreira era o que imaginava? Neide: Eu adorava ser juíza. Já gostava muito de trabalhar como servidora, mas, ao passar no concurso para a magistratura, minha realização profissional foi completa. Claro que tive meus receios no começo, especialmente com a sala de audiências. Quem vem da advocacia geralmente tem mais desenvoltura nesse ambiente, enquanto quem vem do serviço público está mais habituado ao trabalho de gabinete. Como servidora, eu já tinha bastante experiência em elaboração de sentenças, despachos, enfim, tirava isso de letra. No início, as audiências eram um desafio. Superado esse receio inicial, fui ganhando confiança, dominava o ambiente e, realmente, adorava a minha profissão. Sempre trabalhei com muita satisfação. Mesmo assim, sempre dizia que, quando atingisse o tempo necessário, me aposentaria. Defendo a ideia de que os mais velhos devem abrir espaço para os mais novos. Embora muita gente duvidasse que eu fosse mesmo requerer aposentadoria, cumpri o prometido. Gostava muito da carreira, mas me aposentei assim que completei os requisitos para aposentadoria com direito à paridade e integralidade de vencimentos. A prometida paridade foi respeitada por alguns anos. Depois, veio o primeiro golpe: o auxílio-moradia, que foi pago apenas aos ativos. Foi um baque, mas nem se compara ao que está acontecendo agora com essas verbas recentes, que levaram o direito à paridade ao descrédito. A senhora teve uma atuação marcante no movimento associativo desde que se aposentou. Esse envolvimento já era um desejo anterior ou surgiu de forma mais circunstancial? Neide: Quando me aposentei, deixei o Paraná e vim morar em Santa Catarina.

Em defesa da paridade, Sandra Cureau fortalece a articulação da ANAMPA no Centro-Oeste

Após 46 anos no Ministério Público, Sandra Cureau poderia ter optado pelo merecido descanso. Procuradora com atuação destacada em áreas sensíveis como meio ambiente, patrimônio cultural, direitos humanos e direito eleitoral, ela acumulou experiência à frente de cargos estratégicos, como vice-Procuradora-Geral da República e vice-Procuradora-Geral Eleitoral, além de ter sido a primeira diretora-geral da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU). Mas Sandra decidiu seguir na linha de frente. Nomeada em fevereiro de 2025 como coordenadora regional da Associação Nacional de Magistrados Aposentados do Poder Judiciário da União e de Procuradores Aposentados do Ministério Público da União (ANAMPA), no Centro-Oeste, ela tem um histórico de protagonismo nas instituições por onde passou. Agora trabalha para garantir o respeito à paridade constitucional e o reconhecimento dos direitos dos aposentados e pensionistas. “Passamos a vida inteira lutando pelos direitos dos outros. Chegou o momento de lutarmos pelos nossos”, afirmou. Cureau começou sua militância ainda jovem, em plena ditadura militar, nos tempos do Colégio Estadual Júlio de Castilhos, em Porto Alegre. Ali, teve seu primeiro contato com a política estudantil e formou a consciência social que orientaria toda a sua vida pública. Em suas próprias palavras, o que a move até hoje é a “crença de que as pessoas precisam ter oportunidades mais justas”. Na entrevista a seguir, Sandra fala sobre sua trajetória, os desafios da interlocução com o Congresso Nacional e o cenário que, por muito tempo, manteve os magistrados e procuradores aposentados à margem dos debates institucionais. Com a mesma firmeza que marcou sua carreira, ela assegura que não pretende recuar: “se eu puder ser lembrada como alguém que tentou construir um futuro mais igualitário para todos, estarei plenamente satisfeita.” Confira a íntegra: O que a motivou a ingressar no Ministério Público e como foi o início da sua carreira? Sandra Cureau: Eu era advogada trabalhista de sindicatos de empregados durante a ditadura militar. Naquela época, as diretorias dos sindicatos eram indicadas politicamente e, a cada mudança, os advogados acabavam sendo substituídos. Embora bem remunerada, como advogada do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Rio Grande do Sul, que era enorme, não havia estabilidade. Sabia que, com a troca da diretoria, eu poderia ser dispensada. Por isso, minha primeira estratégia para ter algo mais duradouro e estável foi me inscrever para prestar concurso para a magistratura trabalhista, mas o concurso da Procuradoria da República abriu antes. Resolvi tentar, até para testar meus conhecimentos, já que eu havia me formado há pouco tempo. Passei e, depois de entender melhor as atribuições, percebi que o Ministério Público tinha um campo de atuação muito mais amplo, algo que combinava comigo. Percebi que o Ministério Público me proporcionaria uma atuação mais propositiva, iniciando as ações e provocando o Judiciário para que as questões fossem analisadas. E, de fato, assim foi durante toda a minha vida profissional. Trabalhei inicialmente na área criminal, foram oito anos. Atuei no Rio Grande do Sul, depois passei seis meses em Brasília e, em seguida, pedi remoção para Belo Horizonte, onde queria muito estar na época. Lá fiquei por quatro anos. Depois voltei ao Rio Grande do Sul e, em 1988, pedi remoção para o Rio de Janeiro, onde fiquei até ser promovida, por merecimento, a subprocuradora-geral da República, em dezembro de 1997. A senhora ocupou posições muito relevantes ao longo da carreira. Mas, entre todas essas experiências, qual foi a mais desafiadora e por quê? Sandra: Sem dúvida, foi a Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU). Ela foi criada pelo então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro (1995 a 2003), que enviou o projeto ao Congresso e me escolheu para ser a diretora-geral. Na época, eu já tinha uma trajetória como professora em várias universidades – lecionei em Belo Horizonte, Porto Alegre e no Rio de Janeiro – mas nunca tinha participado da criação de uma escola. Começamos do zero. Não tínhamos sequer espaço físico, então a escola funcionou nos primeiros anos em um pequeno gabinete da PGR, na antiga sede da L2 Sul, em Brasília (DF). Também não havia equipe formada: os servidores que vieram dos quatro ramos institucionais do Ministério Público da União (MPF, MPT, MPM e MPDFT) não eram necessariamente os mais experientes, mas sim aqueles que os órgãos podiam ceder. Para estruturar a escola, busquei referências. Visitei a tradicional Escola do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul, outra escola no Rio Grande do Norte e, depois, a Escola Nacional da Magistratura Francesa. Este contato com outros modelos me ajudou a definir o caminho. Criamos cursos de iniciação para novos procuradores, convênios com universidades para pós-graduações, boletins científicos e organizamos seminários internacionais de direito ambiental, trazendo professores da França, especialmente do centro de excelência em Direito Ambiental de Limoges (CRIDEAU) e também professores de Paris. Depois, com a inauguração da nova sede da Procuradoria-Geral, conseguimos parte do prédio antigo para a escola e montamos salas de aula, auditório, salas de convivência e espaços de trabalho. Mas foi um processo difícil. Tínhamos que transformar a escola em algo atrativo para colegas dos quatro ramos e fazer com que eles abraçassem o projeto. Para mim, foi o maior desafio da minha carreira, porque simplesmente precisava dar certo. E hoje, quando olha para a escola que ajudou a estruturar e vê no que ela se tornou, qual é a sua avaliação? E, se possível, gostaria que explicasse, também aos que ainda não conhecem, qual a relevância dessa escola dentro do Ministério Público. Sandra: Hoje nos orgulhamos da ESMPU, que inclusive conta com uma sede própria. A ideia inicial, que veio do Procurador-Geral Geraldo Brindeiro, era de que a instituição tivesse uma estrutura fixa e, inclusive, um dormitório para acolher os colegas que viessem de outras localidades para cursos de iniciação e o nosso estágio probatório (vitaliciamento). Como tínhamos que alojar os colegas em hotéis e isso gerava um custo elevado, os cursos eram mais curtos. Com o tempo, conseguimos estender esses cursos de 15 dias para períodos mais longos e com uma estrutura melhor.

José Carlos Kulzer critica desigualdade criada pela Licença Compensatória: “Aposentados não podem pagar essa conta”

Para quem está de fora, juízes e procuradores aposentados parecem fazer parte do mesmo grupo que hoje ocupa as manchetes sobre supersalários e penduricalhos. A realidade, porém, é bem diferente; e o que deveria ser um debate sobre a paridade virou um problema de imagem também para os aposentados e pensionistas. Quem explica essa distorção é José Carlos Kulzer, diretor Financeiro da ANAMPA na Gestão 2024-2025 e um dos primeiros a criticar publicamente a Licença Compensatória, esclarecendo como a manobra ampliou a desigualdade entre ativos e aposentados. Em seu artigo sobre o caráter remuneratório da Licença Compensatória, ele esclarece o impacto dessa distorção para a categoria. “Não queremos expor os colegas da ativa, mas não podemos nos sentir culpados por algo que não criamos. Quem deve responder por essa distorção são aqueles que implementaram essas benesses para os ativos, não os aposentados, que foram simplesmente ignorados nesse processo”, afirma. Gaúcho radicado em Santa Catarina, Kulzer ingressou na magistratura em 1997, após atuar como advogado trabalhista e procurador da Caixa Econômica Federal. Presidiu a Amatra12 e participou de uma diretoria da AMB, e acompanhou de perto o funcionamento do Judiciário. Essa experiência lhe deu clareza sobre um problema que se agravou ao longo do tempo: a estrutura foi moldada para beneficiar os ativos, enquanto os aposentados e pensionistas ficam para trás. Agora, como diretor Financeiro da ANAMPA, Kulzer se dedica a estruturar a associação com planejamento cuidadoso. Ele defende que a entidade precisa crescer de forma responsável e se consolidar como um espaço de informação e articulação para a defesa dos direitos dos aposentados. Nesta entrevista, ele fala sobre os desafios da nova associação, a luta por paridade e os impactos da Licença Compensatória, além das estratégias para garantir que eles não sejam mais ignorados. O senhor ingressou na magistratura em 1997. Desde a faculdade já tinha o objetivo de se tornar juiz ou essa decisão surgiu ao longo da carreira? José Carlos Kulzer: Não, ser juiz nunca foi meu objetivo inicial. Eu gostava de advogar e estava satisfeito com meu trabalho na Caixa Econômica Federal, onde atuava na defesa da instituição em questões trabalhistas. Em Porto Alegre, éramos uma equipe de oito advogados, e foi justamente ao ver uma colega que trabalhava ao meu lado ser aprovada para juíza do trabalho que me dei conta de que também poderia seguir nesse trilho. Comecei a prestar concursos porque fazia muitas audiências e tinha contato frequente com magistrados, o que despertou meu interesse pela magistratura. Além disso, no Rio Grande do Sul, há uma tradição muito forte na área jurídica, e trabalhávamos com escritórios excelentes. Muitas ações complexas começavam ali e depois se espalhavam pelo Brasil. Defendíamos a Caixa em casos que serviam de referência para todo o País, o que me forçou a estudar cada vez mais. Mas sempre tive uma inclinação para a atuação sindical e associativa. Na Caixa, fui delegado sindical e já havia trabalhado em sindicato. Então, quando entrei para a magistratura, essa visão associativa permaneceu, e foi natural que, mais tarde, eu me envolvesse na luta pelos direitos dos aposentados. Como foi sua experiência como presidente da Amatra12 e o que essa passagem por lá representou para sua trajetória? Kulzer: Foi uma experiência muito mais gratificante para mim do que atuar na própria vara do trabalho. Eu me sentia mais realizado dentro da associação do que no exercício diário da magistratura. Quando você começa a conhecer os bastidores e a estrutura pesada do Judiciário, passa a enxergar certas incoerências e se decepciona com o seu funcionamento. O distanciamento da realidade, os discursos vazios e o descompasso com as demandas concretas da sociedade foram desgastando minha relação com a carreira. Por um lado, temos o Ministério Público, que, ao invés de resolver problemas, muitas vezes cria novos entraves com demandas que parecem mais ideológicas do que práticas. De outro, um Judiciário que sofre com morosidade processual, em um sistema que emperra em formalismos. Quando se está dentro da estrutura, convivendo com essas questões no dia a dia, essa insatisfação cresce. E foi isso que, de certa forma, me fez optar por seguir outro caminho e me dedicar à luta associativa, onde senti que poderia fazer a diferença de forma mais concreta. O senhor foi um dos primeiros a alertar publicamente o caráter remuneratório da Licença Compensatória, hoje um dos pontos de maior indignação entre os aposentados e pensionistas. Poderia nos explicar um pouco melhor do que se trata e por que essa medida gerou tanta insatisfação? Kulzer: A licença compensatória é um mecanismo que foi implementado de forma bastante silenciosa, sem decisão judicial ou previsão expressa em lei, apenas por meio de resoluções administrativas. Diferente do auxílio-moradia, que rapidamente foi entendido pela opinião pública, essa licença é mais difícil de compreender até mesmo para quem é da área, pois foi muito bem arquitetada. O conceito inicial era simples: permitir que magistrados e membros do Ministério Público tivessem direito a um dia de folga para cada três dias corridos, inclusive quando não é prestado trabalho. Só que isso foi sendo expandido de forma absurda. Hoje, essa licença incide sobre férias, recessos, feriados, licenças médicas, afastamentos por auxílio-saúde, licença-maternidade, e até sobre licenças para exercício de mandato associativo. Ou seja, mesmo sem trabalhar, o tempo continua contando para gerar novas folgas. Além disso, essa folga pode ser convertida em dinheiro, à conveniência dos tribunais, o que significa que, na prática, o benefício exclusivo aos da ativa acabou se tornando uma remuneração indireta, isenta de imposto de renda e sem incidência previdenciária. Quando eu soube dessa licença compensatória, nem conseguia acreditar no que estava acontecendo. Comecei a pesquisar e percebi que essa distorção foi se espalhando pelos tribunais e pelo Ministério Público de forma planejada e discreta. A repercussão foi enorme, tanto entre os aposentados quanto entre os próprios ativos que entendiam a gravidade do problema. Claro que nem todos gostaram das minhas críticas. Fui ameaçado de expulsão da minha associação por estar publicamente denunciando essa aberração. Outros colegas, também

“Os aposentados e pensionistas  da ANAMPA não serão invisíveis”: diretora Legislativa, Denise Lapolla, detalha estratégias

Desde o início de sua trajetória, a indignação sempre foi o combustível para Denise Lapolla de Paula Aguiar Andrade. Antes de ingressar no Ministério Público do Trabalho (MPT), atuou na advocacia e no serviço público, passando pelo cargo de auditora fiscal do Ministério do Trabalho e de assistente jurídica da pasta. Ao tomar posse como Procuradora do Trabalho, consolidou sua atuação na erradicação do trabalho infantil, no combate ao trabalho análogo à escravidão e na inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Depois de se aposentar, seguiu engajada na defesa dos aposentados, assumindo a Diretoria de Assuntos de Aposentados da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) entre 2020 e 2024. Durante esse período, trabalhou para ampliar a representatividade dos aposentados e pensionistas e garantir direitos frequentemente negligenciados. Agora, como diretora Legislativa da ANAMPA, Denise encara um novo desafio: fortalecer a articulação política da entidade e garantir o reconhecimento dos direitos dos aposentados e pensionistas da magistratura e do Ministério Público da União. Determinada e enérgica, ela já colocou em prática uma série de estratégias e definiu um cronograma de intensas atividades junto aos parlamentares. O objetivo é claro: mostrar que os aposentados e pensionistas da magistratura e do Ministério Público não são invisíveis, Nesta entrevista, Denise faz questão de pontuar os desafios da nova função e detalhar sua estratégia para mobilizar os associados, garantindo que a ANAMPA conquiste avanços concretos e assegure a eles o protagonismo que lhes é devido. Denise, sua trajetória no Direito começou muito cedo. O que a levou a escolher essa área e como foi seu início na profissão? Denise Lapolla: Sou de Santos (SP) e cresci acompanhando meu pai, que era escrevente na vara do júri, no Fórum de Santos. Isso despertou meu interesse pelo Direito desde cedo. Entrei na Faculdade de Direito de Santos (Casa Amarela) aos 17 anos, meu primeiro emprego foi na OAB local, e, posteriormente, em escritórios de advocacia. Ainda na faculdade, estagiei com advogados que atuavam na área trabalhista e sindical. Depois de formada, e após sete anos advogando, prestei concurso para auditora fiscal do Trabalho, cargo que ocupei por outros sete anos. Em seguida, passei em um concurso de acesso para a assessoria jurídica do Ministério do Trabalho em São Paulo, onde trabalhei por três anos. Em determinado momento de reforma administrativa do governo, com a fusão dos Ministérios do Trabalho e da Previdência Social, fui designada procuradora-chefe do INSS em Cubatão, onde atuei por cerca de três anos. Mais tarde, fui designada  para atuar perante  a Advocacia-Geral da União (AGU), onde passei a representar a União em processos trabalhistas até 1994. E como foi sua decisão de ingressar no Ministério Público do Trabalho? Já era um caminho que você imaginava seguir? Denise: Na verdade, não. Fui motivada por uma colega a prestar o concurso para o Ministério Público do Trabalho (MPT), eis que já tinha experiência na área trabalhista. A atividade de órgão interveniente do MPT não me atraía, mas pesquisando sobre o cargo, tive uma grata surpresa: havia sido criado o órgão agente, com a Lei Complementar 75/1993, que permitia ao Ministério Público do Trabalho atuar ativamente em audiências, fazer diligências, fiscalizações e ações de campo. Isso era algo que me interessava muito. Então resolvi prestar o concurso e, em meados de 1996, tomei posse no quinto concurso de provas e títulos para o cargo de Procurador do Trabalho. Minha primeira lotação foi em Belo Horizonte (MG). Lá, fiz de tudo: pareceres, audiências, atuação no tribunal, negociações coletivas, diligências. Um ano depois eu consegui minha transferência para São Paulo. Ao chegar em São Paulo, você escolheu atuar no órgão agente e logo assumiu a coordenadoria de crianças e adolescentes. Como essa experiência moldou sua atuação e o que levou à sua transição para a defesa dos direitos das pessoas com deficiência? Denise: Exatamente! Como eu disse, sempre gostei de atuar diretamente em audiências e investigações. Fui designada para a coordenadoria que cuidava dos direitos de crianças e adolescentes, uma experiência muito enriquecedora. Atuei junto aos conselhos tutelares, escolas e órgãos de colocação de jovens no mercado de trabalho, identificando casos de exploração da mão de obra adolescente. Fizemos diversas audiências públicas com grandes empresas, cobrando o cumprimento da legislação e garantindo que esses jovens tivessem condições dignas de trabalho. Depois de alguns anos, resolvi mudar de coordenadoria porque o MPT começou a atuar mais fortemente na defesa dos direitos das pessoas com deficiência (PCD). Esse trabalho ainda era incipiente em São Paulo e vi ali uma oportunidade de fazer a diferença. Iniciei um trabalho pioneiro para a inclusão de PCD no mercado de trabalho. Para isso, notifiquei as 100 maiores empresas de São Paulo à época, convocando-as para uma audiência sobre o cumprimento da cota obrigatória para PCDs. Mas esse não era um desafio simples: as empresas alegavam que não encontravam pessoas qualificadas para as vagas. A partir disso, montamos uma estratégia completa. Organizamos encontros entre empresas e entidades que atendiam pessoas com deficiência, garantindo que houvesse qualificação profissional. Também envolvemos engenheiros e médicos do trabalho, que nos ajudaram a identificar postos de trabalho adequados para diferentes tipos de deficiência. E essa atuação cresceu e consolidou-se com o tempo. Foi um período de muito aprendizado e realização. Depois de atuar na inclusão de PCD, você migrou para a área de combate ao trabalho escravo. Como foi essa experiência e quais desafios encontrou nessa atuação? Denise: Muita gente pensa que trabalho escravo só existe em regiões rurais, mas em cidades como São Paulo ele ocorre principalmente nas oficinas de costura, onde imigrantes, sobretudo bolivianos e coreanos, são explorados pelos próprios conterrâneos. Essas pessoas chegam ao Brasil acreditando que terão oportunidades, mas acabam presas em condições degradantes, recebendo valores irrisórios por peça produzida e morando nos próprios locais de trabalho. Nosso trabalho consistia em identificar essas situações, reunir provas e responsabilizar tanto os intermediários quanto as grandes empresas que se beneficiavam dessa cadeia produtiva. Realizávamos audiências e firmávamos termos de ajustamento de conduta para regularizar

Virgínia Bahia traça os rumos da comunicação na ANAMPA para consolidar, engajar e representar aposentados

A defesa dos aposentados da magistratura e do Ministério Público da União exige articulação, estratégia e mobilização. Virgínia Bahia conhece bem esse cenário. Juíza aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, sempre esteve próxima do associativismo, acumulando experiências na AMATRA VI, na ANAMATRA e, agora, como diretora de Comunicação da Associação Nacional de Magistrados Aposentados do Poder Judiciário da União e de Procuradores Aposentados do Ministério Público da União (ANAMPA). Sua atuação será voltada para consolidar a presença da entidade e ampliar o engajamento dos associados. Ela destaca que a ANAMPA reúne profissionais renomados e experiência institucional, incluindo ex-desembargadores, ex-presidentes de tribunais e lideranças com forte atuação no associativismo. Mas Virgínia sabe que a influência da entidade dependerá não apenas da experiência de seus membros, mas da forma como ela se posiciona no debate público e junto às instituições. Para isso, a comunicação precisa ser clara, acessível e eficaz, garantindo que os aposentados se sintam bem informado e que a sociedade compreenda a relevância de suas pautas. Nesta entrevista, ela fala sobre sua trajetória, os desafios da comunicação institucional e o papel da ANAMPA na defesa da paridade e da valorização dos aposentados. Também destaca a importância da transparência no relacionamento com os sócios, pois acredita que um dirigente associativo não pode prometer resultados, mas tem a obrigação de garantir trabalho sério e permanente. Confira a seguir. Na sua visão, o que levou à necessidade de criar uma associação como a ANAMPA? Virgínia Bahia: A forma como as associações representativas tradicionais passaram a lidar com os aposentados deixou evidente a necessidade de uma entidade voltada exclusivamente para este público. Com a criação de diferentes regimes previdenciários, os interesses de ativos e aposentados começaram a divergir de maneira irreversível. Os magistrados e procuradores mais novos não têm direito à paridade e à integralidade, e muitos migraram para o regime de benefício especial. A maioria dos que ingressaram após 2003 não levará nada para a aposentadoria além do teto previdenciário. Diante desse cenário, a prioridade das entidades passou a ser os ativos, buscando inflar os ganhos durante a carreira, sem preocupação com os aposentados. O princípio da paridade, que sempre garantiu isonomia entre ativos e inativos, foi sendo enfraquecido e hoje virou quase uma formalidade sem efeito prático. Quando uma medida tem impacto financeiro para os aposentados, ela é simplesmente ignorada. Assim, percebemos que não poderíamos contar com as associações nacionais e locais para essa luta. A ANAMPA surgiu justamente para preencher essa lacuna, atuando de forma independente na defesa da paridade e dos direitos dos aposentados da magistratura e do Ministério Público. Além da defesa da paridade, a ANAMPA também busca evitar distorções na política remuneratória. Como enxerga esse cenário? Virgínia: Exatamente! O problema vai além da paridade. A política remuneratória atual está criando distorções graves que, no longo prazo, prejudicarão até os que ainda estão na ativa. Um dos papéis fundamentais da ANAMPA é ser uma contenção para esses penduricalhos, que distorcem a remuneração e enfraquecem a estrutura de carreira. Sempre digo isso aos mais jovens: no futuro, eles vão se arrepender. Esse modelo está engessando a magistratura e o Ministério Público de tal forma que, cada vez mais, os profissionais adiam a aposentadoria para não sofrer perdas salariais. Eu levei pouco mais de três anos para me tornar juíza titular. Hoje, antes mesmo dessa onda de penduricalhos, o tempo médio já estava em cerca de 15 anos. Com o atual modelo, a tendência é que os juízes, por exemplo, permaneçam como substitutos por toda a carreira, porque o impacto financeiro da aposentadoria será insustentável. Sabemos que a ANAMPA ainda não tem o mesmo peso político das associações tradicionais, mas estamos aqui para fazer o enfrentamento necessário. Nosso compromisso não é apenas com os aposentados de hoje, mas com a construção de uma estrutura que não comprometa o futuro da magistratura e do Ministério Público. A ANAMPA se propõe a ser um contraponto ativo na defesa da paridade e dos aposentados. O que diferencia a associação das demais e como avalia o impacto que já conseguiu gerar desde sua criação? Virgínia: A ANAMPA nasceu com uma proposta muito clara: atuar politicamente e ser um obstáculo real para qualquer iniciativa que enfraqueça a paridade. Esse direito está na Constituição e precisa ser respeitado, independentemente de ser incômodo para alguns. Nosso foco é garantir representação para os aposentados da magistratura e do Ministério Público em um cenário onde, historicamente, esses grupos foram deixados em segundo plano. O que nos diferencia de outras tentativas de organizar aposentados é que conseguimos sair do papel com rapidez e estrutura. Muitas associações surgem com boas intenções, mas sem a experiência necessária para viabilizar uma atuação consistente. A ANAMPA é formada por pessoas que já passaram pelo associativismo e conhecem bem seus desafios. Isso faz diferença, porque sabemos que criar uma associação não é só reunir algumas pessoas e formalizar um estatuto. Além disso, temos entre nossos associados ex-desembargadores, ex-presidentes de tribunais e figuras muito respeitadas dentro da magistratura e do Ministério Público. Sabemos que, no início, houve resistência e até tentativas de desqualificar a ANAMPA como uma iniciativa sem relevância. Mas estamos construindo uma entidade forte, respeitada e capaz de defender os interesses dos aposentados com seriedade. Você já havia tido experiências diretas na área de comunicação antes de assumir a diretoria da ANAMPA? Como foi o processo de aceitar o convite para essa função e quais desafios enxerga na condução dessa comunicação tão diversa? Virgínia: Não, nunca tive experiências diretas na comunicação. Quando fui presidente da AMATRA VI, por exemplo, tínhamos uma diretora de comunicação e uma equipe, com quem eu mantinha contato próximo, mas nunca estive diretamente responsável por essa função. Mas, embora não tenha conhecimento técnico em comunicação, minhas percepções são muito intuitivas e gosto desse desafio. É o que eu já disse em outras oportunidades: em entidades como as nossas, quem assume essa tarefa muitas vezes vem de outras áreas de formação, mas acaba desenvolvendo uma percepção política sobre